You And I - Capítulo 93
A reunião de Isabella com o grupo foi curta. Apenas o tempo suficiente para acertarem alguns pormenores. Quando saíram da sala de aula onde se tinham reunido, deram de caras com o diretor Wilson, acompanhado do treinador da equipa de futebol. Já todos na escola sabiam que, com a saída de Tim e Leo da equipa, as coisas não estavam nada famosas e, ultimamente, os dois reuniam-se várias vezes para tentar encontrar uma solução.
- Professora Isabella, aconteceu alguma coisa? - O diretor quis saber ao vê-los todos juntos, tão cedo
- Não, não aconteceu... - Isabella disse. Ia acontecer dentro de momentos.
- E pode dizer-me qual o motivo de estar reunida com todos estes alunos logo de manhã? - insistiu
- Escusas de dizer que estavam a tirar dúvidas, Isabella, esses alunos são de anos diferentes - O treinador meteu-se, irritando Isabella, que tinha mesmo pensado em dizer isso
- Mas era mesmo isso que estávamos a fazer! - Laura respondeu - Estávamos a esclarecer uma dúvida...
- Vocês são de anos diferentes, menina Collins. A matéria de português não é a mesma nos dois anos - o diretor disse, observando todos eles, à procura de alguma coisa que lhe estivesse a escapar
- Mas eu não disse que a dúvida era de português... - Laura respondeu, testando os limites. Sabia que estava a abusar, mas estava tão farta das atitudes que os dois homens tinham há anos para com alguns alunos, que já estava por tudo.
- Menina Collins! - Wilson repreendeu
- Desculpe, diretor, mas vamos mesmo ter de ir embora. - Nick falou - Não estávamos a fazer nada de mal, apenas a pedir um esclarecimento à professora Isabella sobre um assunto escolar - explicou sem entrar em detalhes - Acho que ainda é permitido falar com os professores nesta escola, certo? - perguntou, sem querer uma resposta. Apenas queria ser convicente e sair dali - Podemos ir? Não queremos chegar atrasados às nossas aulas - acrescentou. Sem mais nada que pudesse dizer, Wilson lá os deixou passar. Isabella seguiu por um caminho diferente, para não dar nas vistas. Mas todos se reencontraram novamente no portão da escola - Acho que podemos começar, certo professora? - Nick perguntou, olhando à volta. Como ainda não tinha tocado, havia vários alunos ali reunidos, alguns deles ainda a chegar. Repararam também, ao fundo, num homem com uma câmara, acompanhado de uma mulher. Devia ser a amiga de Isabella. Theresa e Edward também estavam por ali, cada um em seu carro. Edward, ao vê-los, saiu do carro e encostou-se ao mesmo, à espera. A mãe da Isabella passou por eles, antes de ir para o seu posto de trabalho.
- Tem cuidado, querida! - Aconselhou. Trabalhava na secretaria da escola e não queria nada ter de tratar dos papéis de despedimento da filha
- Não te preocupes, mãe! - Isabella deu-lhe um beijo na testa - Mesmo que corra mal aqui na escola, alguma coisa boa há de sair disto - garantiu. Olhou para os alunos e, depois de todos afirmarem que estavam prontos, desenrolaram os cartazes e começaram a manifestação. A amiga de Isabella, Julia, depressa se aproximou deles, acompanhada do cameraman. Nos cartazes liam-se frases como Chega de discriminação!, Queremos uma escola segura e justa!, Não ao racismo e preconceito!... Há volta deles a multidão foi crescendo. Apesar de muitos alunos estarem apenas a ver, outros juntaram-se a eles e aplaudiram a iniciativa. Theresa olhava-os com orgulho, já Edward olhava furioso por ver Laura e até mesmo Leo a participar numa coisa daquelas. Os gritos acompanhavam os cartazes, o que só chamava mais à atenção. A jornalista aproximou-se de Isabella e preparou-se para lhe dar a palavra.
- Bom dia! Estamos em direto da Escola Secundária, onde alguns alunos estão em protesto. Pedem uma escola sem discriminação e onde possam ter o apoio dos professores e do diretor, o que, segundo eles, não tem acontecido. - Julia ia falando - Tenho comigo Isabella, uma das docentes desta escola, e a grande responsável desta iniciativa. Professora Isabella, pode explicar-nos os motivos que a levaram a organizar este protesto? - perguntou, apesar de Isabella já lhe ter explicado. Mas era esse o seu trabalho e queria que a amiga explicasse ao mundo como as coisas funcionavam por ali
- Trabalho nesta escola há algum tempo e tenho visto coisas impensáveis, infelizmente! - Isabella começou - Há alunos a ser gozados pelo tom de pele ou pela orientação sexual. E o pior disto tudo é que não são apenas discriminados pelos colegas adolescentes, mas também por aqueles que os deviam educar, que os deviam ensinar a respeitar os outros. - prosseguiu, claramente emocionada - Há uns tempos que as coisas pioraram, mas ninguém fez nada. Na verdade, só fizeram com que as coisas ficassem ainda pior.
- Disse-me que já trabalha aqui há algum tempo e que tem vindo a presenciar este tipo de atitudes... Houve algum acontecimento em particular que a tenha levado a agir agora? - Julia perguntou, dando oportunidade a Isabella de contar tudo.
- Sim... - a professora admitiu - Há uns dias, um grupo de alunos veio ter comigo, a pedir ajuda numa questão pessoal. Nesse momento fiquei a saber de algumas coisas que me chocaram. E percebi que não era suficiente ajudá-los nessa questão mais pessoal, era preciso ir mais além. Infelizmente, não agi tão depressa como devia. Uma aluna acabou por ser atropelada no estacionamento quando um aluno decidiu dirigir em direção a um outro aluno pelo simples facto de não concordar ou respeitar a sua orientação sexual.
- E o que aconteceu com esse aluno? - Julia quis saber, também ela chocada
- O aluno foi expulso, mas de resto, ninguém fez mais nada - Isabella disse, triste - Não houve uma reunião de pais, nem uma reunião com os alunos. Não houve qualquer chamada de atenção. Parecia que, como a aluna ficou minimamente bem, não era preciso falar mais no assunto. Foi como se quisessem ocultar o que se tinha passado. - Contou - E revolta-me ter de trabalhar num sítio assim. Revolta-me ver como um grupo de adolescentes, que me ajudou com esta manifestação, consegue ser mais responsável e consciente do que a pessoa que gere esta escola. - acrescentou
- Ficamos com o testemunho da professora Isabella, cujo objetivo é mostrar a realidade que, infelizmente, se vive em muitas escolas do país - Julia falou agora para a câmera. Depois de mais algumas imagens do que se estava a passar, Julia continuou a sua reportagem - Tenho também comigo um dos alunos envolvido nesta manifestação. Ao seres uma pessoa de etnia cigana, sentiste algum preconceito na escola?
- Sim, desde o primeiro dia! - Alex admitiu - Ouvi bocas, comentários desagradáveis... E não apenas dos meus colegas. Há professores que também demonstram esse preconceito. Até alguns pais de colegas meus demonstram esse preconceito. - Alex olhou na direção de Edward, que se tinha aproximado para ver e ouvir melhor - Felizmente há pessoas boas, que nos aceitam como somos, mas não é fácil vir para a escola todos os dias e ser criticado a toda a hora, sem sequer podermos contar com o apoio de quem nos devia ajudar - concluiu
- Obrigada pelo teu testemunho - Julia agradeceu, sorrindo com compaixão. Depois todas as atenções se viraram para o diretor Wilson. Alguém já o tinha avisado do que se estava a passar. Julia correu na sua direção, esperando obter algumas declarações - Diretor, pode por favor, fazer algumas declarações? - Julia pediu - A escola está a ser acusada de colaborar em atos discriminatórios para com alguns alunos... - ela começou, sendo logo interrompida
- Isso é mentira! - Wilson disse
- Mas há alunos que se queixam de ser discriminados pela sua etnia, orientação sexual... Houe até um acidente recentemente... - a jornalista ia insistindo. Confiava em Isabella e, por isso, sabia perfeitamente que Wilson estava a tentar dar a volta à situação
- Exatamente! Foi um acidente e o aluno que o provocou já foi expulso! - Wilson disse, mantendo a postura - Acha mesmo que se fôssemos uma escola discriminatória, iriamos aceitar alunos diferentes? - perguntou
- E quanto aos alunos que teceram comentários racistas e preconceituosos aos colegas? O que é que lhes aconteceu? - Julia continuava
- Minha senhora, são jovens! Não podemos levar tão a sérios comentários feitos em tom de brincadeira! Nunca ninguém aqui foi violento com ninguém! - Wilson dizia - A professora Isabella é demasiado sensível e está a fazer de uma situação resolvida, uma verdadeira tempestade!
- Não, não está! - Nick decidiu meter-se e todas as atenções se voltaram para ele - No ano passado toda a gente ficou a saber que sou homossexual. E foi horrível! Ouvi comentários tão maldosos que nem sequer tenho vontade de repetir. E não foram apenas os outros alunos a fazê-los. Não sou parvo e percebia perfeitamente os olhares, as bocas que alguns professores mandavam. Felizmente, tenho uma família e um grupo de amigos que sempre esteve lá comigo. Foi o que me valeu. Há tanta gente que não tem esse apoio. Não sei o que teria feito se tivesse tido de passar por tudo isto sozinho - Nick contou - E as aulas de educação física eram as piores! - acrescentou, olhando para Trevor, o treinador de futebol e professor de EDF, que estava ao lado do diretor - Quando fiz queixa ao professor, ele disse-me para deixar de ser uma florizinha - contou, deixando os presentes de olhos postos no homem - Os comentários dos colegas são graves, mas ter professores a dar-lhe palmadinhas nas costas é ainda pior. De repente deixamos de poder contar com as pessoas em quem deveriamos confiar - terminou
- Isso são calúnias! - Wilson disse para defender Trevor - Nenhum professor aqui defende esse tipo de comentários, quanto mais fazê-los - defendeu
- O Nick tem razão! - Tim falou pela primeira vez. Estava nervoso. Nunca se imaginara naquela situação, ainda por cima do lado da razão - Eu fui um dos alunos que gozou, criticou e humilhou o Nick e tantos outros! - admitiu. Ainda por cima em direto, para tanta gente. Só tinha pena que a mãe dele e o pai de Alycia tivessem de ouvir aquilo - E não apenas o Nick. Humilhei o Alex, saturei a Laura por ela os defender tanto, tratei mal a Alycia. Disse tanta porcaria. E tudo porque o meu pai me incentivou para ser assim. E estes dois senhores nunca me fizeram nada... Absolutamente nada! O treinador Trevor sabia de tudo. É treinador da equipa de futebol e ouvia as nossas conversas no balneário. E sempre nos deu palmadinhas nas costas. Sempre concordou e sempre nos fez querer que estávamos certos. - Testemunhou, deixando os outros dois furiosos e sem palavras - Portanto sim, esta escola sempre permitiu que pessoas como eu tratassem os outros de uma forma miserável! - disse, a olhá-los nos olhos
- E fazem-no por dinheiro! - Leo meteu-se, ele sim deixando todos surpresos. Mas ele não aguentou. Enquanto Tim falava, Leo estava a observar o pai ao lado da mãe, a falar de uma forma rude para ela. Tudo lhe veio à cabeça. Os comenrários do pai, as lágrimas da mãe e da irmã, o estalo que levou quando o pai descobriu sobre Nick, a humilhação que sentira ao ouvir o treinador falar de "um caso de homossexualidade". - Eu saí da equipa de futebol porque o principal patrocinador se recusou a dar mais dinheiro caso o jogador homossexual continuasse lá. - admitiu, olhando de lado para o pai
- E pode dizer-nos quem é esse patrocinador? - Julia perguntou
- Não... Não vou descer ao nível dele e prefiro preservar a privacidade da família dele... - Leo disse. Denunciar o pai implicava falar no nome da família e não queria que os avós paternos e Laura passassem por uma situação dessas. - O que importa aqui é que é urgente que esta situação se resolva. Não podemos continuar a ser educados por pessoas que não têm princípios absolutamente nenhuns. - Terminou, dando a palavra novamente a Julia. Houve mais alguns alunos a denunciar situações que tinham vivido ali na escola. Julia tentou que o diretor prestasse mais declarações, mas este recusou, dizendo apenas que tudo aquilo era um exagero e que iria apurar a verdade e tomar medidas relativamente a tudo.
Isabella e os alunos continuaram ali durante todo o tempo das aulas da manhã. Como estava a passar em direto no canal de televisão onde Julia trabalhava, depressa chegaram também outros jornalistas que quiseram saber mais sobre aquele assunto. O diretor já lá não estava. Estava reunido com outros professores, aqueles que o apoiavam nos seus ideais. No fim da manifestação, Isabella, Laura, Nick, Leo, Alex, Tim e Alycia optaram por ir almoçar fora da escola, para assim estarem mais à vontade e poderem conversar.
- E agora? - Alycia perguntou
- Agora só nos resta esperar... - Isabella disse - A nossa parte está feita. Denunciamos a situação e agora tenho a certeza de que alguém vai ficar do nosso lado. Os responsáveis da educação não vão permitir que isto continue e de certeza que o diretor será confrontado com esta situação. Claro que poderão querer falar com vocês também. - ela continuou - Quanto a ti, Tim, gostei imenso da tua atitude - elogiou
- Acha que ele pode ser punido? - Leo perguntou
- Não sei... Talvez tenhas alguma penalização por bullying. Mas para te penalizarem a ti, terão de penalizar outras pessoas também. Alunos e professores. - Isabella disse - Mas como não houve nenhuma queixa diretamente contra ti, creio que não terás problemas, Tim. Além disso, dás-te bem com as pessoas com quem gozavas. Acho que eles vão estar mais preocupados com a queixa contra o diretor e os professores... Eu apresentei queixa contra o diretor e o Trevor no ministério - ela explicou - O que eles fizeram é demasiado grave...
- Se for preciso algum pai fazer alguma coisa, tenho a certeza de que os meus pais se disponibilizam. - Alex disse e Nick concordou com ele.
- Tim, não precisas de ficar assim tão apreensivo - Isabella disse perante a expressão do rapaz - O William foi expulso porque provocou um acidente, acho que o teu castigo, se tiveres, não poderá ser assim tão grave. Além de que já pediste desculpa a muitos dos envolvidos e mudaste de "lado" - acrescentou
- Não é isso... - Tim disse, olhando para Alycia - O teu pai ja sabe de tudo o que eu fiz... - disse-lhe
- O meu pai vai perceber, Tim! - Alycia disse, pegando-lhe na mão - E ele já viu como tu és agora. De certeza que vai perceber e acreditar que tu mudaste. Eu dei-te uma oportunidade e ele também vai dar. E tenho a certeza de que a tua mãe vai ajudar - assegurou. Sorriu-lhe e ele respirou fundo, tentando manter a calma. Tudo o que não queria era que Anthony se pudesse afastar de Meredith por causa dele e das suas asneiras. E também não queria que Anthony o tentasse afastar de Alycia. - E a professora, como é que vai ficar? - Alycia perguntou ao fim de um momento
- Eu tenho a certeza de que, quando chegar à escola, tenho os papéis da demissão à minha espera... - disse, claramente triste, mas a fazer um esforço para mostrar que estava bem. Acabaram o almoço sem falar mais naquele assunto. Quando regressaram à escola, todos os olhares recaíam sobre eles, uns mais felizes que outros. Isabella foi informada de que o diretor a aguardava no gabinete. Quando lá chegou, percebeu que tinha razão. Lá estavam eles em cima da secretária: os papéis para a sua demissão.
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Boa tarde! Como estão? Espero que gostem deste capítulo. Fiquei triste pela Isabella e sentia a tristeza dela enquanto escrevia. Mas mais coisas virão. Obrigada a quem está desse lado. Fiquem bem e até ao próximo capítulo :)